Hoje fomos à casa da Anne Frank em Amesterdão. E fiquei surpreendida pelo facto que, ainda nos dias de hoje, as pessoas não se darem conta do poder e significado que as palavras podem ter. Pelo menos até termos experiências como estas.
Quando começámos a visita ao museu, estavam, numa sala pequena, quatro televisões onde a voz de uma rapariga relatava a ascensão da Alemanha-Nazi e como tinham começado a tratar os judeus, o que levou muitos a emigrarem.
Não se ouve um único ruído na sala. Não é a mesma coisa quando o professor ou professora passa um filme na aula e há sempre aquela criança mais malcomportada que se recusa a calar. Ou como depois de um ataque ou acidente horrível, oferecemos um minuto de silêncio aos que pereceram e existe aqueles segundos de confusão antes de nos apercebermos do que está a acontecer.
Aqui só ouvimos o sotaque britânico da criança que representa Anne Frank e o som das pessoas a respirar à nossa volta. E, quando ela termina de falar, vemos dezenas de pessoas a olhar para um ecrã preto, sem se atreverem a mexer, a falar, e alguns até se esqueceram de respirar durante uns segundos. Uns segundos é o tempo que demora até a normalidade voltar. Segundos esses que são o suficiente para te fazer pensar: “se as pessoas se sentem tão comovidas pelo que aconteceu, se aquelas palavras lhes fizeram sentir qualquer coisa de tal forma que se esqueceram de tudo o resto, então porque continuamos a permitir que coisas destas ainda aconteçam?”
Continuamos a visita e, apesar de lamentar o que aconteceu com a Anne e tenha lamentado mais ainda quando li o seu diário e descobri que ela nunca chegou a ter o seu final feliz, não consigo deixar de pensar se não foi a morte dela que fez com que a sua voz silenciosa fosse ouvida por milhares. Eu li um livro semelhante ao de Anne Frank, chamado Clara, A Menina que Sobreviveu o Holocausto, sobre uma rapariga que escreveu um diário durante os tempos que permaneceu com a família debaixo do soalho de um amigo que os escondeu nos tempos da guerra. As condições de vida que a família de Clara ultrapassou foram muito mais severas, e existe um episódio onde quase sufocam uma criança sob o medo de serem apanhados, mas ela nunca teve o reconhecimento público de Anne. Talvez tenha sido porque o seu livro foi publicado numa altura mais tardia, onde a guerra já começava a ser uma memória distante, quando o sofrimento era apenas uma cicatriz que já não doía. Ou talvez seja porque a sua sobrevivência não teve o efeito de catalisador que levou a Anne à fama.
Ela queria ser famosa mesmo já depois de morta. Ela queria deixar uma marca que permaneceria já depois de ter fechado os olhos e conseguiu o seu desejo. Mas porque só lamentamos aqueles que sofrem depois de já ser tarde demais para ajudá-los?
Racismo ainda não é uma coisa que está completamente no passado. A descriminação por diferentes crenças religiosas continua tão presente quanto nos tempos antissemíticos. Horrores de guerras ainda são permitidos nalguns países, onde as pessoas não têm ninguém a lutar por eles. E basta reparar, que a primeira coisa que os EUA fizeram quando a Segunda Guerra Mundial terminou foi criar um país segregado. A África do Sul criou o apartheid… E agora temos outros países a dizer que o holocausto nunca aconteceu, que foi apenas uma história inventada.
Será que os humanos não aprendem com os erros?