Este post contem alguns detalhes extra para poder alimentar a curiosidade da minha prima que me pediu e, para a eventualidade de ela sempre ir a Auschwitz, poder saber como chegar.
A primeira coisa que pensei quando cheguei ao campo foi: “estou a usar duas camisolas, dois casacos, um gorro e um cachecol e umas botas fortes e estou a morrer de frio. Como é que aquelas pessoas sobreviviam com apenas um pijama às riscas?” Ao caminharmos para a entrada começou a nevar. O sangue nas minhas veias parecia demasiado espesso e não demorou muito até que os sítios onde a circulação é mais lenta começassem a arder. Pouco depois, até o acto de tirar fotografias era restringido ao absolutamente necessários nas minhas mãos sem luvas.
Auschwitz I está dividido em blocos, e alguns desse blocos estão abertos ao público para exposições sobre a vida nos campos de concentração. A historia que algumas das tabletas de descrição contam são atrozes: “aqui eram dispostos os corpos dos que morriam a tentar fugir para assustar os outros prisioneiros”, “aqui foram assassinados centenas de pessoas, não faça muito barulho para respeitar os que pereceram” entre outras… Mas essas não são as histórias que me fazem um pequeno nó na garganta que me obriga a respirar fundo. São as histórias de solariedade. Aquela que diz que uma mãe foi separada da sua filha pequena e que, mais tarde na liberação dos campos, a reencontrou devido à bondade de estranhos que tomaram conta dela e a protegeram. As histórias em que crianças sobreviventes de Auschwitz relatam que os adultos construíam-lhes brinquedos a partitr de trapos, pedras, madeiras e outros materiais que encontravam. A história de um padre que se voluntariou para morrer de fome para salvar a vida de um homem de família. Os horrores a que aquelas pessoas foram submetidos não me surpreendem, mas ver aquele instinto protetor que caracteriza a nossa espécie no que toca a proteger os mais novos, sim. Ver que ainda existiam pessoas que não deixaram a esperança, a bondade e a soliedariedade morrer enquato sofriam actos de crueldade macabros? São nessas alturas em que descubro o verdadeiro significado de “humanidade”.
Mesmo com o frio e a neve ocasional, o museu estava cheio. Algumas das pessoas traziam ramos de flores, talvez pessoas empáticas com o que aconteceu ou mesmo familiares de alguém que lá viveu, mas ainda assim são estas pessoas que de vez em quando me lembram que o que aconteceu ali não é algo que vem de um livro de terror, não são histórias inventadas. Aquelas pessoas eram humanos verdadeiros com famílias verdadeiras. Como é que coisas como o medo, ódio, desejo de poder e abstinência de opinião permitiram que aquelas histórias se tornassem uma realidade?
A maneira como o museu está disposto permite que pessoas mais sensíveis que talvez se achem incapacitadas de o visitar, consigam fazê-lo. Vemos coisas muito mais macabras no nosso dia à dia na televisão. Mas existem outras partes menos complacentes. Salas que mostram, numa vitrina de uma ponta à outra, as duas toneladas de cabelo recuperados de sacas armazenadas que os alemães usavam para vender como têxteis. Milhares e milhares de sapatos puídos e rotos, retirados das pessoas à sua chegada, quando lhe entregavam socas de madeira. No meio de tanto sapato quase que se pode considerar um milagre quando encontras os únicos dois pares de sapatos completos.
Quando visitámos a câmara de gás em Auschwitz estava um pouco à espera de sentir o tal cheiro a queimado que as pessoas falam quando visitam o campo, mas tal não aconteceu. Foi depois de apanharmos o shuttle grátis que nos leva até Bikernau (Auschwitz II) que o tal cheiro se tornou presente. Dezenas (talvez até centenas) de crematórios estão dispostos, partidos e queimados de um dos lados do campo. Do outro lado estão as barracas onde os prisioneiros eram obrigados a dormir em três andares, apertados uns contra os outros por falta de espaço. Alguns até escreveram os nomes, com medo de serem esquecidos que ali estiveram, medo que a história os classifique como apenas mais um número que morreu no holocausto…
Para quem deseja saber: da estação de Varsóvia (Warszawa Centralna) existem comboios diretos para Cracóvia (Kraków Glowny) que variam entre os 15-75 euros, dependendo das horas e dias (eu aconselho a ir ao posto de informação na estação e perguntar qual é o comboio mais barato). A viagem dura cerca de 3 horas.